terça-feira, 19 de setembro de 2017

Em desabafo após ter carro perfurado, agente penitenciária do RN critica omissão do Estado

 
Vidro quebrou após o carro ser atingido entre as janelas laterais (Foto: Cedida ao G1)
Por Anderson Barbosa, G1 RN – Na hora de uma situação dessa, ninguém, ninguém toma uma providência. Ninguém se junta comigo ou faz alguma coisa. Eu fico muito triste. Eu tô desabafando com vocês. Saí muito assustada de onde eu vim agora. Acabei de chegar em casa. Eu tava na delegacia. E o que eles me falaram como experiência deles não gostei. Não foi bom pra mim. Não está sendo bom pra mim. Entenderam? Mas, é isso aí. É o sistema, galera. É o sistema”.
O desabafo (ouça AQUI o áudio completo) foi feito por uma mulher que há sete anos é agente penitenciária no Rio Grande do Norte. Na manhã do sábado (16), a caminho do presídio onde trabalha, algo atingiu uma das janelas do carro dela. Para muitos, foi apenas uma pedra. Porém, para policiais civis que viram o estrago, o carro foi alvo de um tiro de espingarda. O boletim de ocorrência, segundo a agente, será registrado ainda nesta segunda-feira (18).
Com o impacto, um buraco foi aberto entre as janelas laterais do veículo, coisa de um palmo apenas da direção da cabeça da motorista. “Quase fui morta. E isso só o sistema não quer ver”, disse a agente ao G1.
O sistema a que a agente se refere é o sistema prisional potiguar. Atualmente, o Rio Grande do Norte possui 864 agentes penitenciários. Outros 571 devem ser convocados até o final do ano como forma de diminuir o deficit na área, que é de aproximadamente 1.000 profissionais. Contudo, segundo o sindicato da categoria, o Estado precisa se preparar não apenas para dar assistência aos que estão para ser incorporados, mas principalmente aos que já estão em atividade.
Segundo o sindicato da categoria, agentes penitenciários do RN não recebem atenção devida para a saúde física nem para a saúde mental (Foto: Thyago Macedo/G1)
130 agentes afastados

“A profissão de agente penitenciário é a segunda mais perigosa do mundo e a mais estressante. No nosso estado, somente este ano, 130 agentes já se afastaram de suas funções por licença médica. Sem falar nos que precisam tomar remédio para dormir ou mesmo os que tomam remédio para conseguir ir trabalhar. E quando chegam ao local de trabalho, enfrentam um ambiente totalmente insalubre, hostil, sem qualquer assistência em meio a muitos presos doentes e em meio a tantos que estão se matando”, ressaltou Vilma Batista, diretora do Sindicato dos Agentes Penitenciários do RN.

“Hoje, não há nenhum setor dentro do sistema que ofereça amparo aos agentes. A falta de atenção à saúde física e mental do servidor é total. Vivemos sem valorização profissional. E isso fica nítido a cada postagem feita pelo atual governo frente às conquistas das demais categorias. Desta forma, só nos resta nós mesmos, pois é um por todos e todos por um”, acrescentou Vilma.

O G1 pediu uma resposta à Secretaria de Justiça e da Cidadania (SEJUC), órgão responsável pelo sistema prisional potiguar, mas até a publicação desta matéria ainda não havia se manifestado.

O desabafo

Pessoal, é como um desabafo. Eu faço o meu trabalho e faço o que posso fazer de melhor. Sempre foi assim. Não é a primeira vez que acontece coisas comigo no sistema. Uma vez eu peguei uma presa que fugiu da João Chaves e… peguei ela na rua. Ninguém viu isso. Acho que ninguém soube. Saí da João Chaves, do Feminino, por ameaças. A única arma que eu consegui na minha vida, que foi um 38 todo acabo, foi com o major Castelo Branco, que ele me arrumou assim, na hora. E com Dinorá, também. Que, inclusive, depois que houve uma mudança de secretaria, ela me pediu de volta prometendo me devolver uma outra, mas não aconteceu. E, eu não tenho condições de comprar uma arma.

E depois do ocorrido, de sábado, que eu fui trabalhar, fiquei de plantão, na minha, muito calada, muitos chegaram pra mim e disseram: ah, isso foi uma pedra que jogaram… isso e aquilo. Dois agentes, eu conto na mão, que se preocuparam comigo e que foram atrás, que… ei, vamos lá, num sei o que… mas, já tinha dado tanto tempo, né, … e… assim…

Aí o diretor da unidade chega… ah, talvez foi uma pedrada daqui, e tal, não falou mais nada, ninguém falou mais nada. Certo, porque num momento desse, tudo bem que ninguém sabe às vez nem o que falar, mas… uma preocupação, alguma coisa, num sei… ninguém chegou pra dizer assim: vamos agora na delegacia, vamos registrar isso aqui, vamos tomar providências, vamos fazer, nada… eu que saí do plantão cansada, hoje, e passei na delegacia e fiz o registro. E os agentes todos foram me atender, e viram, que, aquilo ali não foi uma pedra. E muitos dizendo que é uma pedra.
O subsecretário chegou e eu contei a situação. Foi no meu carro, olhou, também não disse mais nada. Ele não falou nada. Nenhuma instrução de nada. Então é isso aí, eu fico muito triste, muito triste. Porque eu sei a profissional que eu sou, o que eu faço. E na hora de uma situação dessa, ninguém, ninguém toma uma providência, ninguém se junta comigo ou faz alguma coisa… sabe? Eu fico muito triste.

Eu tô desabafando com vocês. Fico muito triste. Saí muito assustada de onde eu vim agora. Acabei de chegar em casa, que eu tava na delegacia. Acabei de chegar em casa. E o que eles me falaram como experiência deles não gostei. Não foi bom pra mim. Não está sendo bom pra mim. Entenderam? Mas, é isso aí. É o sistema, galera. É o sistema.

 Fonte : G1 RN

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