quinta-feira, 30 de novembro de 2017

PESSOAS QUE FALAM DEMAIS

Resultado de imagem para PESSOAS QUE FALAM DEMAIS 

A pergunta é: como explicar o comportamento de algumas pessoas que falam demais? Que não param de falar?

Bem, o primeiro ponto que devemos entender é que, apesar do que pode parecer à princípio, não existe tanta diferença entre o comportamento verbal e o comportamento verbal encoberto ou privado. Em outras palavras, falar e pensar são comportamentos semelhantes, a única diferença consistindo na possibilidade de ser observado por uma ou mais pessoas.

Digo apesar disso porque temos a tendência de considerar o pensamento como um algo a mais e não é incomum encontrar explicações metafísicas ou transcendentais sobre o que consiste o pensamento.

A fim de simplificar podemos observar uma criança. Por exemplo, esses dias estava em uma viagem de ônibus e um garotinho de cerca de 6 anos estava contando para a sua mãe (em alto e bom som) sobre a diferença dos fonemas Ti e Di. Dizia ele que antes ele não sabia dizer direito o ti e o di e assim confundia todas as palavras que tinham o ti e o di. E como toda criança, ele estava fascinado com a sua descoberta.

Por isso, ele dizia e dizia de novo até que sua mãe pediu para que ele parasse de falar ti e di.

Nesta simples observação do comportamento verbal de uma criança podemos ver como o que a criança pensa e diz é praticamente a mesma coisa. Ou seja, o que ela pensa ela diz e o que ela diz ela está pensando em voz alta. Do mesmo modo quando aprende a ler, a criança lê em voz alta e só com o tempo aprende a ler para si mesma, “em voz baixa”.

A partir desta perspectiva, começamos a notar que pensar e falar não são comportamentos tão diferentes. Uma pessoa que fala pouco é, com certeza, uma pessoa que pensa muito. Pensa mas não fala. E a pessoa que fala muito, pensa, enquanto fala. 

Mas então o que explica a diferença de uma pessoa hiper tímida e uma pessoa tão falante que chega a incomodar os que estão perto?

Pelo que pude compreender até hoje em meus estudos das diversas áreas da psicologia, existem 4 explicações plausíveis para o comportamento verbal de pessoas que falam demais.

falar-demais

1) A cognição

Cognição aqui diz respeito à tudo o que pensamos, principalmente através de imagens e através de sons. Quando digo que uma pessoa que fala pouco, pensa muito, afirmo com total convicção não porque tenha me sido dado o privilégio de ver a mente das pessoas, mas sim porque podemos fazer diversos experimentos que comprovarão a dificuldade das pessoas de ficar em silêncio.

Por exemplo, se passamos um exercício simples de meditação, Yoga ou uma tarefa de concentração em um problema, logo veremos que as pessoas vão relatar que a sua mente divaga, vai para outros lugares, para o passado e para o futuro.

Se solicitarmos que a pessoa fique em silêncio, ela vai depois nos contar que é praticamente impossível ficar em silêncio – interno – por alguns minutos que seja.

Portanto, comprovamos que todas as pessoas pensam muito. Alguns estudos apontam que temos cerca de 60.000 pensamentos todos dias…

Enfim, a explicação para uma pessoa que fala demais e uma pessoa que fala de menos não deve ser buscada na diferença de cognição. Afinal, ambas pensam também excessivamente.

Contudo, as pessoas que se dedicam a uma vida introspectiva, religiosa ou espiritual, tendem a ser mais silenciosas. Exemplo disso são os monges do Oriente e, mais perto de nós, alguns padres através dos quais notamos um tom de voz calmo e tranquilo – o que é reflexo do seu estilo de vida e de seu pensamento.H

Assim, embora a maioria das pessoas provavelmente vai ter uma cognição a mil, algumas outras que buscam um estilo de vida diferente, tentam e acabam por conseguir silenciar o seu fluxo mental.

2) A motivação e o afeto

Embora tenhamos que diferenciar teoricamente entre motivação e afeto, vamos colocar os dois conceitos unidos aqui por uma questão de brevidade.

Uma pessoa que era até o mês passado uma pessoa falante, mas que simplesmente parou de falar e responde monossilabicamente apresenta uma mudança comportamental digna de nota. Ela pode estar, por exemplo, passando por um quadro de depressão.

A mudança no afeto e na motivação, típicas da depressão e de outros transtornos mentais, explica a mudança de comportamento, de falar muito para falar quase nada. Na direção oposta encontram-se os estados maníacos e hipomaníacos nos quais o paciente que falava com uma frequência normal passava a falar sem parar.

Evidente que não temos que falar em transtornos mentais para mostrar que uma diferença no estado emocional vai afetar o comportamento verbal. Para além das nosologias, temos os dias em que estamos mais animados e falamos mais e os dias em que estamos mais desanimados e falamos menos.

3) O ambiente

De acordo com a psicologia comportamental, o comportamento verbal é um comportamento como outro qualquer e deve ser entendido a partir do que acontece antes e do que acontece depois como todo e qualquer outro comportamento.

Por exemplo, uma pessoa está quieta. Se lhe perguntamos que horas são, isto será o antes do comportamento que, por sua vez, vai aumentar a probabilidade de a pessoa responder  “- agora é meio-dia”. O que vem depois – “obrigado” – também afetará a tendência futura de a pessoa responder a uma pergunta.

Uma cena real que aconteceu com uma amiga foi como segue. Ela chegou em um ponto de ônibus e perguntou para uma mulher que estava ali: – “Você sabe se o ônibus do Carioca já passou?” E a mulher respondeu: “E eu sou obrigada a te responder?”

Esta cena, da qual rimos muito depois, espantou a nossa amiga. Afinal, a mulher foi muito mal educada. A questão é que a tendência de nossa amiga de perguntar se um ônibus passou ou não tenderá a diminuir no futuro, pois a consequência que obteve (a resposta da mulher) foi aversiva.

Exemplos assim também acontecem no dia-a-dia, entre amigos e familiares. E com consequências agradáveis e desagradáveis, vamos descobrindo o que falar e com quem falar. Assim, falamos de futebol com quem gosta de futebol e de astrofísica com quem é fascinado pelo assunto…

De modo que quem fala demais ou não teve experiências externas aversivas ou não deu importância a elas. Um exemplo contrário é o caso do mutismo seletivo, diagnosticado no DSM-IV.

4) O cérebro e o corpo

Uma outra alternativa para explicar o comportamento verbal excessivo é o funcionamento do cérebro e do corpo. Se você ingerir uma substância como álcool, a química da substância irá interferir no seu cérebro, e, com isso, haverá a tendência maior de falar mais.

Casos extremos de traumatismos cranianos, de derrames ou do uso de drogas mais fortes (como chá de cogumelo) também comprovam que a alteração na fisiologia cerebral afetará diretamente a fala.

Um fenômeno pouco conhecido mas que igualmente tem efeitos é a modificação da postura corporal e musculatura que envolve a fala. A liberação do que Reich chamou de couraça do caráter – na boca e na garganta – também pode fazer com que uma pessoa quieta se transforme instantaneamente em uma pessoa falante.

Já dei o exemplo aqui de uma pessoa que foi ao dentista e, depois de receber mais anestesia do que o necessário, sentiu a sua boca solta (esta foi a sua descrição). E com a boca solta começou a falar tudo o que tinha guardado durante os últimos 30 anos.

Conclusão

Portanto, penso que podemos concluir que existem diversos motivos que explicam o fato de uma pessoa falar demais. É importante nos lembrarmos que qualquer pessoa que encontrarmos pensará demais. Entretanto, devido à criação, circunstâncias, postura corporal e motivações e afetos, o comportamento variará do silêncio à fala ininterrupta.

Nenhum comentário:

Postar um comentário